“Pare! Este é o Império da Morte”. O aviso na entrada do túnel deixava claro que vivos são minoria a partir daquele ponto – no máximo 200 pessoas. Continuar é uma escolha pessoal. Nós não pensamos duas vezes e rapidamente entramos no maior ossuário do planeta. São as Catacumbas de Paris, complexos de túneis que cortam praticamente todo o subsolo da capital da França. Ali se encontram os restos mortais de cerca de 6 milhões de parisienses, gente de várias épocas. Ok, não é exatamente o lugar mais glamoroso de Paris, mas como deixar de visitar algo tão inusitado?
Nas paredes, um número incontável de crânios, tíbias e outros restos humanos, tudo organizado de forma quase artística. Esculturas e obras de arte também adornam os corredores. Hoje as Catacumbas – ou pelo menos uma pequena parte delas – viraram uma concorrida atração turística. Para visitá-las é preciso enfrentar uma fila de cerca de uma hora, além de desembolsar 8 euros. Só que nem sempre foi assim. Houve uma época que o Império dos Mortos não aceitava turistas.
Paris foi uma cidade do Império Romano, sendo, portanto, habitada há séculos. Durante todo esse período, os cemitérios da cidade foram ocupados por gente que morreu de todas as formas possíveis: em guerras, batalhas, massacres, vítimas de doenças, pestes, e até mesmo, pasmem, de causas naturais. Após milênios de ocupação humana, Paris chegou ao século 18 com um problema de superpopulação nos cemitérios, muitos deles localizados dentro da cidade.
O Cimetière des Innocents, na época o mais velho de Paris e em uso desde a Idade Média, tinha sido convertido numa espécie de sepultura coletiva onde até 1500 mortos ocupavam a mesma tumba. Tudo isso começou a incomodar os vizinhos vivos. Os cemitérios contaminavam os reservatórios de água de Paris, fazendo com que mais gente resolvesse bater as botas e passar para o lado de lá, aumentando o problema, que virou quase que uma bola de neve, só que de ossos. A solução encontrada pelo Rei foi uma espécie de reforma agrária para um MST diferente: o movimento dos sem tumba.
Os Túneis Subterrâneos de Paris
Ao longo dos séculos, diversas minas subterrâneas foram escavadas ao redor de Paris. Boa parte das pedras usadas na construção da cidade saíram dessas minas, que com o tempo caíram no esquecimento. Quando chegou o século 17, ninguém sabia a profundidade e o tamanho das galerias que se escondiam debaixo de Paris. O problema é que nessa época a cidade já tinha crescido, ocupando os espaços acima das antigas minas. O resultado? Diversos acidentes e desabamentos, o mais significativo deles em 1774. Foi nesse ano que uma casa desabou, na rua d’Enfer, perto da atual Avenue Denfert-Rochereau.
Esse desabamento foi o estopim para que o Rei Luís XVI, o mesmo que depois perdeu a cabeça na revolução francesa, criasse uma comissão para investigar o que diabos havia debaixo da Paris. Durante anos, essa comissão catalogou os subterrâneos da cidade, reforçou a estrutura das áreas que corriam risco de cair e nomeou as galerias de acordo com as ruas que passavam acima delas. Enfim, finalmente tudo ia bem na Paris subterrânea. Foi nessa época que os mortos chegaram.
Em 1780, outro desabamento acordou os mortos e incomodou os vivos. Por causa do peso excessivo das sepulturas, um dos muros do Cimetière des Innocents cedeu. O Rei ordenou que o cemitério fosse fechado, assim como todos os outros que ficavam dentro da cidade. Juntar um problema com o outro foi uma decisão quase óbvia e, alguns anos mais tarde, os restos mortais de milhões de parisienses foram retirados desses cemitérios e colocados em parte das galerias subterrâneas recentemente reformadas.
A mudança dos mortos não foi fácil e muito menos um trabalho que qualquer um topasse fazer. De qualquer forma, os parisienses resolveram tirar vantagem da situação. Sabe aquela história de que nossos antepassados iluminam o caminho dos vivos? Isso teve um significado literal na Paris do século 18. Por conta da superpopulação a la Bangladesh, faltava oxigênio nas tumbas do cemitério. Com isso, mesmo corpos enterrados há décadas não estavam completamente decompostos e uma enorme quantidade de gordura humana foi retirada das tumbas. Se os ossos foram para as Catacumbas, a gordura foi para as fábricas de sabão e velas. É sério isso. Se você não acredita em mim, leia esse artigo da Scientific American.
O que você faria se fosse um morto da Idade Média que foi repentinamente acordado, retirado de sua tumba coletiva e levado para galerias espaçosas? Eu acho que aquilo deve ter virado uma festa do arromba, com o galerê sacudindo até os ossos. Além do mais, a história mostrou que criar um Império dos Mortos foi uma decisão com um timing perfeito, afinal poucos anos depois, em 1789, rolou a Revolução Francesa, que fez com que muitos nobres e revolucionários perdessem as cabeças.
Na época, os franceses começaram a enterrar os mortos da revolução diretamente nas Catacumbas. Isso incluiu gente famosa, como Danton, Robespierre e o químico Lavoisier, que depois da morte pode testar na prática seu famoso ensinamento de que “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” – até seus ossos, que podem virar atração turística.
Fotos
gostei muito. pesquisei por conta do filme assim na terra como no inferno.
ResponderExcluirEstou super animada para conhecer as catacumbas de paris
ResponderExcluira cor da fonte é horrível . Grrr
ResponderExcluir